4.1.06

SANCTUS JANUARIUS, por João Ivo

Presto aqui minha homenagem ao mês de Janeiro, overture do ano que se inicia. E que tal homenagem sirva também de alento para dissipar os ares por demais melancólicos que nos últimos tempos têm assolado este espaço:
"Ó tu, que com dardo de flama
Partes o gelo da minha alma,
Para que ela se lance fremente
Ao mar de sua suprema esperança:
Sempre mais clara e mais sã,
Livre na lei mais amorosa __
Assim exalta ela teus milagres,
Belíssimo Janeiro!"
A esta altura, suponho que o autor de tais versos já não precise de cicerones.

3.1.06

"Para habermas, a demanda política por uma maior reflexividade na formação da opinião coletiva tem como pressuposto experiências privadas que se originam na esfera íntima da pequena família. Este é o lugar na qual se origina historicamente a privacidade no sentido moderno do espaço de exercício de uma interioridade livre e satisfeita. O status do homem privado, como dono de mercadoriais e pai de família, completa-se com a compreensão política que a esfera pública burguesa faz de si mesma. Antes de assumir funções políticas, no entanto, o processo de autocompreensão das pessoas privadas adquire a forma de privacidade. Essa esfera pública literária não é originariamente burguesa, mas sim uma herança da aristocracia cortesã transmitida à vanguarda da burguesia que mantinha contato com o "mundo elegante".
O crescimento das cidades vai possibilitar, a partir da proliferação da cultura dos cafés, dos salões, etc., a institucionalização da esfera pública. Os herdeiros burgueses do humanismo aristocrático, no entanto, logo passam a conferir caráter crítico às suas formas de esfera pública burguesa. A partir de 1750, também as novas formas literárias dominantes assumem formas especificamente burguesas como o drama burguês e o romance psicológico, ou seja, adquirem formas que propiciam tematizar a forma especificamente burguesa da nova subjetividade que se constitui nessa época. A pequena família burguesa representa um forma de comunidade distinta tanto da família aristocrática como da família camponesa. A esta sociabilidade original corresponde uma nova forma de arquitetura das casas, garantindo um espaço de privacidade par cada um dos integrantes da família, assim como formas de convívio que se destinam a exercitar o novo tipo de individualidade que se constitui. A passagem da carta ao romance psicológico, como forma paradigmática de problematização das questões existenciais e subjetivas, já aponta para o maior grau de abstração e de elaboração da reflexividade que se institucionaliza."

Jessé Souza traduzindo Habermas em "A modernização Seletiva", página 62.

1.1.06

Hoje é só mais um domingo. Para mim não mudou nada de ontem para hoje e creio que irá continuar tudo do mesmo jeito por um bom tempo; não vou mudar tão cedo.
Este é o ano em que mais vomitei sangue e que mais chorei. É o ano em que aceitei o quanto sou idiota. Que percebi o quanto me diverte esfaquear os que me abrem os braços. "Este que é o Luciano! Que saco! Que suma!"
Os que lerem isto verão que não faço outra coisa do que me atravessar com cravos e tentar não deixar que este ano acabe; tento agarrar alegremente com minhas mãos o que já escorreu pelos meus dedos.
Escrevi o que se segue e muito do que ainda se seguirá. Até que deu frutos, infelizmente não devorados.

"As coisas que saiam de minha boca, assim como as que saiam pelas mãos, invariavelmente não se tornavam o que deveriam ser, não eram. Faziam de mim um mero esquema, sem calor, sem lágrimas, sem cheiro, sem sorrisos... sem carne. E toda vez que os meus olhos viam-me chorar diante da evidência de poder fazê-lo por coisas que normalmente piso, jamais simplórias, e ao mesmo instante que sentia que os limites de meu corpo me sufocavam por tão grande que me tornava, sentia quanto as palavras eram miseráveis, desnecessárias. Quanta ingenuidade... Não há "palavras", e sim, " minhas palavras"; eu era o miserável. Por mais hábil que eu fosse, ainda me deixaria seduzir pelo desejo de dizer mais do que se precisa, coisas invariavelmente desnecessárias. Meia dúzia de palavras já são mais que suficientes para quase tudo que preciso, para o que de fato importa, e não fará muita diferença quais sejam, além de que, a maneira que se diz é que irá evidenciar o que quero, o que sou. Um sussurro em meio a afagos, pode dizer mais que qualquer carta. Também, não só as palavras dizem-me, expressam-me. O que um olhar, um abraço, um sorriso - o que eu mais prezo - diz? O suficiente para que eu dê um passo se siga adiante, se eu entendê-los como meu chão. Mas por que outra complicação, isto não tem fim? O quero dizer poderá ir de encontro ao que quer escutar, ao que o seu ser deseja, ou não. Tal encontro seria apenas obra do acaso?

Como e bom caminhar sob teu calmo olhar."

notas de um dia de cão. esse é o nome do livro. um livro a duas mãos.