17.11.05

Esquece-se quando se deseja esquecer?
“Não posso esquecê-la” é sinônimo de “Não quero esquecê-la”?
“Não a esquecerei!” é uma decisão?
Esquecer é um ato de vontade?
Esquecemos de coisas todos os dias. Só nos damos conta quando a coisa por um motivo ou outro retorna.
“Leio o mesmo autor todos os dias, não adianta só compreendê-lo”; Idéias e coisas são objetos que estão no mesmo nível de pessoas?
“Paixões não duram para sempre, que sejam infinitas enquanto durem”; quantas temos em uma vida?
“Naquela casa morava um amigo que eu não lembrava”; se não visse a casa lembraria do amigo?
“Ainda penso em em você todos os dias, vem-me sem que eu passe pelos lugares onde a vejo”; as lembranças estão ligadas a lugares, objetos, coisas que se vêem?
“Isolar-se só lhe traz depressão, afastar-se não a afastará porque está dentro de ti”; mesmo longe das coisas comuns as lembranças se mantêm; a lembrança não só está ligada a determinadas coisas.
“Alguém perguntou o número do ônibus que leva para o bairro onde eu trabalhava. Sei onde é o ponto, mas não me lembro do número, não consigo. Faz só três anos que não vou lá. Mas e daí? Tenho mais o que fazer.” Podem surgir, todos os dias, novas coisas para serem feitas, novas rotinas, novas pessoas. Necessariamente abandona-se algumas pelo simples fato de não se ter tempo, o suficiente para se dedicar a todas. Abandona-se um caminho por circunstâncias que nos obrigam a seguir outros. Muda-se assim as paisagens a serem contempladas, coisas belas e ruins, que até então jamais imaginadas, são descobertas. O que não implica que devem ser necessariamente acolhidas. Esquece-se o número do ônibus, mas não se esquece dos amigos que fez onde trabalhava; o que faz essa pessoas persistirem na mente, como se lá habitassem?
“Naquela casa morava um amigo que eu não lembrava” e “Ainda penso em você todos os dias”; a diferença de freqüência e intensidade com que se lembra de alguém está relacionada com a sensação de falta? Além disso, cada ente lembrado está ligado a nossa história pessoal; são intrínsecos, a sua maneira, às nossas práticas de vida? Podemos ter consciência das práticas que norteiam nossas expectativas? Se não, esquecer depende pouco de nós; o pouco é a vontade que pouco age. Como se desvencilhar da opinião ordinária? Como conceber a possibilidade de sequer existir um tal desvencilhar e que há algo que deve ser discernido; que há ditos semelhantes, mas de ordens distintas?
“O idiota fica contente em vê-la, por isso a vê”; quanto aos móveis da vontade, explicação alguma os acalma.
Esquecer é ter indiferença?

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notas de um dia de cão. esse é o nome do livro. um livro a duas mãos.