26.2.07

"Música”, sorrindo peço para o escuro.
Como um pequeno sorriso agradeci pela a escolha dele: Mystique.

Num velho quarto num velho casarão. O lustre no teto que não acende.
Sem sono, desci para a cozinha. Perto do filtro de barro estava uma garrafa bronze a olhar-me. Perguntou-me por que a esqueci e respondi ironicamente: “Ainda não sabe que ela me abandonou?” A cachaça: “Prove-me e me diga..." Viu que permaneci distante e sem intenção de tomá-la. Depois de alguns segundos continuou: "Sua memória é tão fraca! Certa vez, e não faz muito tempo, tornei-a para ti tão bela, tão bela como me pediu. Quando ela negou a ti os seus cachos a dor preencheu o seu peito e só o ódio conseguiu comprimi-la. Inutilmente vagueou pela possibilidade de negá-la. Você dizia: "Como posso amar o meu o próprio algoz! É possivel alimentar amor por quem te massacra e te faz ver-se como fraco?" Parece que foi ontem... Quis que eu ajudasse a aceitar essa 'contradição', como disse em suas palavras, e eu te mostrei que não há 'contradição' alguma. O que são as pedras? Elementos condensados de uma maneira. Há pedras que nossa imaginação jamais dará conta. As que mais se aproximam de nossos ideais chamamos de preciosas. |ainda vou acabar este texto, quando o sono me permitir|Ela voou, mais alto que qualquer altar. Lembra que seus cânticos que antes tornaram-na tua, que celebravam a existência que ambos trouxeram à vida tornando-se até a própria vida!, quiseram tornar-se tudo? Quiseram ser ato! O mundo é tão grande e tuas palavras tão ínfimas. Ainda me lembro quando me disse: ‘Preciso de ti para fazê-la mais bela, menos humana! Quero amar e não sofrer!’ Simplesmente virou-me em seu corpo. Eu, cachaça, que posso fazer? Posso traduzir seu desespero em sonhos, fazer seus passos o do dançarino e sua dança única, mas jamais transformar o mundo para além da sua retina. Como foi tolo em achar que eu duraria para sempre em suas veias!, que eu, volátil, lhe daria por anos a fio todos os versos que queria! E além de tudo, quem amaria um ébrio? Logo que descobriu quem é, deixou-lhe um adeus.”
Levei a garrafa para o quarto e dormimos.

notas de um dia de cão. esse é o nome do livro. um livro a duas mãos.