Tal é, pois, o quadro e a situação da filosofia no século XX. Dos grandes filósofos, daqueles considerados gênios u gigantes, Husserl foi o último a colocar a filosofia em compasso com a ciência, ao pensar o fundamento das matemáticas, bem como a tentar pôr a filosofia em sintonia com o seu tempo, ao pensar a crise da civilização européia – porém, que se lembra dele hoje? E quem se há de lembrar depois que Weber, melhor do que ele, pensou o destino do Ocidente n’A ética protestante e o espírito do capitalismo? Heidegger, por seu turno, continua a trilhar a senda do idealismo alemão ao trocar a metafísica pela ontologia e, sem ter o que dizer a respeito da ciência, depois de juntar filosofia e arte, refugiou-se em sua cabana na Floresta Negra e lá ficou à espera do clarão e do chamado, quer dizer, como Schopenhauer e Wittgenstein, agarrou-se à saída mística. Quanto à Wittgenstein, ao que parece, ao trocar o cristal puro do Tractatus pela antropologia cultural difusa das Investigações filosóficas, deixou intocado o silêncio místico. Não os wittgensteinianos, que trocaram a mística pelo pragmatismo, muitas vezes um pragmatismo ralo, cuja consistência e maior densidade vão buscar no culturalilsmo e relativismo das inúmeras visões de mundo disponíveis no mercado das crenças de Londres, Nova York e São Francisco. Lá, como alhures, em São Paulo, em Berlim e em Nova Delhi, os wittgensteinianos – não todos, evidentemente -, continuarão despreocupados e seduzidos, a reverenciar as extravagâncias do indivíduo incomum e a cultuar a mente divina do mestre, sem se darem conta de que os sociólogos, antropólogos e lingüísticas, além de melhor aparelhados, estão mais bem aquinhoados nesse terreno, eu digo, o terreno da cultura e da história.
Domingues, Ivan. Trecho do texto Desafios da filosofia no século XXI: ciência e sabedoria lido pelo autor na conferência “Prêmio Fundep 2005”, do qual foi ganhador
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